domingo, 13 de abril de 2014

Erros

Me pergunto diariamente, por que tão errado?
Quando penso em acertar, só erro
Meto os pés pelas mãos, e atordoado
Ao invés de um suspiro, me sai um berro

Que coincidência estranha nós dois
De tanto nos acertarmos nos derrubamos
E meu erro, crasso, emudeço, pois
Não há de haver erro quando nos amamos

Ajoelho, e com as mãos na cabeça, desespero
Não há vida sem ti - não quero!
Rogo perdão, aos céus, a ti, prometo não errar

Nunca mais hei de tantos erros cometer
Engolirei cada palavra que não lhe for de prazer
Só e somente só você voltar a me amar

quinta-feira, 3 de abril de 2014

O Almoço (ou Bar Luiz)

O Almoço (ou Bar Luiz)


Resolvi me dar um almoço de presente. Não, não é uma data especial, é apenas um capricho que todo Homem deve se dar vez ou outra. Saí de Botafogo em direção ao centro, onde cresci. A Rua da Carioca, entre o Largo da Carioca e a Praça Tiradentes costumava ser o paraíso, e era para lá que eu me encaminhava, com sede de lembranças e uma fome um tanto castigante. Em meio ao novo comércio da Carioca, ainda se erguiam alguns recintos que fazem parte da nossa história. Em meio aos despercebidos cidadãos, ainda se vêem alguns da mais bela estirpe da cidade. Gosto de pensar que eu sou um desses. Um desses que tem apreço pelo que é tradicional, pelo que é belo, pelo que foi base do meu crescimento. Sigo, na direção da Praça Tiradentes, com passos lentos e observadores. Ao meu redor, noto entre tantas lanchonetes, lojas mal organizadas, o Bar Flora, ainda de pé, ainda forte. Mas não é ali meu destino, é um pouco mais a frente, entre a clássica loja de instrumentos À Guitarra de Prata e o clássico e decadente – desde sua criação – Cine Íris, onde passei parte de minha adolescência, buscando instrumentos para saciar meus prazeres – musicais e luxuriosos. O numero é 39, e o nome, é Bar Luiz. Fundado em 1887, quando Dom Pedro II ainda era Imperador e fingia governar o país, com outro nome, estabeleceu-se ali no 39 da Rua da Carioca em 1916, por problema de locação, já com o novo nome devido a lei de valorização da língua nacional de 1915. Dali, não se mudou mais. Claro que teria que ser ali, naquele recinto onde me fiz homem. Mas essa é outra história. Adentrei. Com a cabeça levantada, os pés em ponta e os olhos perdidos se depararam com meu ilustre amigo Gravata-borboleta. Seu nome é Jerson, e desde que me entendo por gente, ali, é ele quem me serve... perfeitamente. Quando o vi, já sabia que minha mesa estava pronta e a minha espera. Não sei se por interveniência divina, por acaso, ou mesmo por condição instintiva, não importa a hora, eu sempre chego lá cinco minutos antes de lotar. Eu não quero parágrafos nesse texto para não perder a continuidade, mas peço uma pausa, para um gole de cerveja e um adendo. À altura que estou sentado me alimentando saborosamente, faz-se uma fila enorme do lado de dentro e de fora do local, cheio de ávidos senhorios buscando saciar seu paladar. Retornando. Ao sentar-me na mesa, que no horário do almoço é enorme para uma pessoa, mas não cabe quatro, a velha recepção de sempre. Um abraço caloroso, meu chope gelado sem precisar pedir, o sorriso leve de Gravatinha e... peço o cardápio, para sua surpresa. Às vezes o peço somente por desencargo de consciência, ou metidez, já que o conheço de cor e salteado, de outros carnavais. Gravatinha se vai, desempenhar a mesma função para as outras mesas do seu quadrante. Passo a vista na carta, e como desconfiava minha intuição, a pedi somente por desencargo de consciência, ou metidez. O prato é o mesmo que peço a pouco mais de uma década. O suculento Empanado de Frango – acebolado – com batatas coradas (essa é a pedida do almoço, à noite os hábitos mudam), que degusto com um prazer quase infantil. Engraçado escutar do Gravatinha que ‘aquele meu amigo pediu a mesma coisa ontem’. Hábitos antigos dificilmente morrem. E, não diferente, já empanturrado, faço questão do pudim com ameixa, sem o qual meu almoço ali não está completo. Desde o momento que começo a comer o empanado, até o momento que peço para o Gravatinha trazer a dolorosa, abstraio tudo ao meu redor, com exceção do falatório das mesas, dos gritos dos outros gravatas, ‘me dá um claro’, ‘dois escuros e um garoto’, ‘pudim sem ameixa’, ‘frango’, ‘carne’, ‘bolinho de bacalhau’, ‘fecha mesa 4’, ‘viajando na mesa 17’, do tilintar de talheres nos pratos, dos gritos por lugares na porta. O resto, eu abstraio tudo. E me lembro, do meu amor, de velhos amigos e companheiros, hoje ausentes, bebedeiras memoráveis, fla-flus inflamáveis, choros, sambas, alegrias, tristezas, dias, noites e madrugadas. E com lágrimas nos olhos, pelo que está acontecendo com o estabelecimento nesse momento difícil, pelo que está para acontecer de trágico na minha vida, quando os pés puser fora daqui, dou a ultima colherada no pudim e peço a conta. Deixo para o Gravatinha sua parte, por fora, coloco um palito na boca para mastigá-lo, vou ao banheiro. Na volta, minha mesa já está tomada, por dois rapazes que ali frequentam a pelo menos umas quarenta primaveras a mais que eu. Despeço-me dos conhecidos, do Gravatinha, dos outros gravatas, peço licença e abro caminho por entre os “em pé” na porta se engalfinhando por um lugar em alguma mesa. Saio, retornando à vida, ao mundo, me perguntando se a cidade merece que o bar se mude mais uma vez.


quarta-feira, 2 de abril de 2014

Tudo

Tu és tudo, que graça, não há onde não estejas
A cada direção que olhe, és tu, que minha vista deseja
No entre acordar e dormir, entre chegar e sair,
Transcendes o relógio, o contador de horas
Transcendes o espaço, dentro de mim és pólvora

És o que não esqueço, o que não apago
És sol de praia com seu sorriso ardente
És dança na chuva, com o amigo ao lado
És presença certa em tantos sonhos
És tomar banho, cuidar da dor de dente,
Cuidar do corpo, da alma, da mente,
És tudo... a falta de limites, a inconsequência
És matéria dada na escola da minha vivência
Colo de frio, colo de saudade, a própria saudade
És batom vermelho, que não desbota, que não sai,
Que marca o peito, que mata o ego e a vaidade
És sexo: o selvagem, o improvisado, o amorzinho
E também és a inocência em brinquedo de parquinho
És o não entendo, deixa que explico, crise de ciúme
És tanto a amizade quanto a paixão envolvente
És Fernão Capelo Gaivota, és dos livros, o melhor
A vontade de voar, na gente, é maior!
És tantas mulheres juntas, em corpo único
A virgem em polvorosa beijando escondida
A mãe de família com insônia de tanto amor
A senhora sem pudores de vida bandida
A apaixonada, contando estrelas, chorando sua dor
E por falar em estrelas, és touro, constelação
Vertigem da falta de quem chamar de paixão
És batimento descompassado de um coração
A espera de quem seja de escorpião
És canções de Caetano, linda, tigresa,
Dominas o homem e o Leão
És menina desatinada do seu rapaz
És Andrômeda, dona da maior beleza
És Helena, causadora de guerras e de paz,
És samba, és ritmo, és tamborim
És coleção de sardas, óculos de gatinho,
Cabelos curtos, riso grande,
Em dias de Não, me olhas e és só Sim...

De tantos sentimentos que não cabem no peito
De um menino vadio que não sabe se comportar
És ritmo acelerado desse mesmo menino na sessão
De cinema das cinco, só pensa em beijar...

E depois do beijo, que vida lhe apresentaste,
Calma contra desespero, dor contra alegria
Distância versus prazer, gozo versus vergonha
Homem contra menino, noite versus dia
Corpo mais alma mais cabeça, gente mais animal,
Rio de Janeiro, Bangu por Ipanema, e Carnaval.

terça-feira, 1 de abril de 2014

Soneto de Abandono

E de repente, como quem adormeceu por uns instantes
Me vejo sozinho, abandonado no meio de uma infinita
Estrada, sem sinalização, um sem direção constante
Que a minha existência – desde o princípio – limita

Como posso sair daqui ileso? Como, sem arranhão?
Me consome a lembrança de dias claros e amenos
Em que felicidade era companhia, e na amplidão
Dos sentimentos, éramos completos, nada menos.

Agora, maltrapilho de tanta andança sem fim
Atrás de um dia passado que me dava tanto prazer
Me sinto vazio, sem norte, sem alma, sem mim

E assim, deixa de ser uma dádiva o viver...
Penso na Morte como solução para o que não tenho mais,
E abandonado, nu e à mercê, só seu beijo frio me dá paz.