segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Um Dia Na Feira


Quinta-feira é dia de feira. Assim como quarta e sexta. Sábados e domingos também o são, mesmo tendo negado seus sobrenomes. Terça já foi, mas se juntou ao serviço de segunda, um laborioso dia de descanso.

José Tibúrcio gosta de chegar cedo, junto com sua esposa Carminha:

-Isso é trabalho de velho! Sabe velho, que não quer ficar parado dentro de casa? Então. Isso é trabalho de velho.

Quando chegam em sua velha Kombi amarela, a armação da barraca já está montada. Com o padronizado toldo vermelho e branco. Ela já foi maior, e já foi deles, mas a demanda já não é a mesma de outrora. “Já vendi toalhas a R$15,00, mas aí foi ficando R$18,00, R$20,00, R$25,00 e hoje é R$30,00. Aí não dá.” E às 6:40 h tem início a transformação. As duas barracas recebem novas ripas, cordas, balcões, mostruários e suportes. Para não estragar a mercadoria (roupa também queima ao sol), uma lona maior cobre o novo “conglomerado”. Neste único ponto, Seu José, 77 anos, pede ajuda ao feirante vizinho, e com ele executa um exercício inimaginável para alguns sessentões.

Seu José, como é conhecido entre suas clientes, confia em uma antiga caixa de frutas, de madeira boa, como escada. Ali de cima dança o bamboleado dos pregos frouxos  e amarra cada ponto de sua barraca. O novo toldo é amarrado nas grades e portões dos vizinhos, não sem que antes seja pedida a devida licença, mesmo sem o vizinho presente.
Tudo na barraca é pensado. Atrapalha quem pensa que ajuda. Antes mesmo de a barraca estar completamente arrumada (isto só acontece lá pelas 10:00 h), possíveis clientes já xeretam um preço ou outro. E então chegam seus clientes de verdade.

- Dona Neide, a senhora compra comigo há quanto tempo? Uns 6 meses?

- Sou sua cliente há 35 anos, Seu José! responde uma orgulhosa senhorinha de 85 anos. – Lembro pois comecei a comprar com o senhor quando minha neta nasceu. Vim acertar o que lhe devo. Dona Neide limpa seu nome para fazer mais uma dívida com novas blusas e calças que não lhe causam alergia.

Outra cliente orgulhosa responde sem ser perguntada:

- Também sou bem antiga! Comprei aqui o enxoval da minha filha.

Há também alguns percalços:

- A gente deixa comprar fiado, mas aí morre e ninguém assume a dívida. Uma senhora que sempre vinha aqui faleceu de uma hora para a outra. Mas ela também comprava algumas roupas no centro, então como vou provar para a família que ela me devia R$400,00? Perdi essa. Tem também outra senhora, que a filha e anora compravam aqui comigo, mas quando morreu todo mundo sumiu. Mais R$150,00 que não vou ver.

Fiel aos seus clientes perpétuos, Seu José não se permite ficar em casa. Ainda espera a renovação de sua licença de feirante.

Deixemos de conversa. Meio dia é hora de desmontar tudo e ir para casa.

Um comentário:

  1. o mais interessante... é que da pra ver isso diariamente em cada feira que tu vai... os mesmos diálogos...

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