domingo, 22 de dezembro de 2013

Gil

Vem lá meu negro,
Brancos cabelos,
Diz: _Me chame de Preto
E te beijo.
Como a Pai e Mãe
E te deixo.
De pele branca,
E cabelos louros
Ser preto... mesmo que de alma.

Casualidades


Um cachorro da raça labrador acabava de derrubar a terceira cadeira da lanchonete à beira-mar causando caos e sujeira por todo o ambiente. Ele rodava e lambia tudo que estava no chão. Tudo que seu nariz conseguia cheirar. Os clientes começaram a se agitar para tentar pegar o cachorro. O animal, rápido e perspicaz conseguia driblar a todos e se dirigia à porta de entrada quando sua dona atrasada e cansada por ter corrido atrás do cachorro por um bom trecho chegava à lanchonete. Ao avista-la o cachorro voltou correndo para dentro e após alguns dribles avistou um homem no canto lendo um livro distraidamente, sem se importar com a confusão. Em um impulso o cachorro se lançou no colo desconhecido e ali se acalmou a esperar pela sua dona.

O homem por sua vez, recuperado do susto que havia levado com um labrador pulando em seu colo e ambientado com todo o ocorrido, deu espaço ao cachorro e deixou que a dona se aproximasse:

- Desculpe senhor. Por favor, me desculpe. Eu não sei o que deu nele!

- Tudo bem. É um bonito cachorro e bem carinhoso apesar de levado. – O cachorro olhou para ele com ar de desaprovação do ultimo elogio que recebeu como se entendesse o significado das palavras.

- Obrigado. Obrigado, mas me desculpe – e virando-se para o cachorro disse: Leni malvado! Não pode ouviu? Não pode! – E o animal abaixou olhos e orelhas sabendo que havia feito coisa errada.

- A propósito, meu nome é Paulo.

- Rebeca.

- Rebeca. Você gostaria de se sentar?

- Não posso. Tenho que voltar.

- Toma. Meu cartão. Adoraria ter seu telefone, mas sinto que você não vai me dar. Então me liga, por favor.

- Não devo ligar, você sabe que...

- Não importa. Ligue quando quiser. Só ligue.

 

***

 

O quarto do hotel ficava no sétimo andar. Era um hotel pequeno do centro da cidade. Normalmente quem vem nesses hotéis são pessoas casadas que procuram distancia dos olhos de todos. Já era a quarta vez que eu vinha aqui. Agora era só esperar.

Rebeca chegou dez minutos depois. Ela estava com uma saia preta justa no corpo e uma blusa levemente transparente. Sem sutiã. Ela sabia me provocar. Eu via o mamilo duro por debaixo da blusa roçando o tecido. Era enlouquecedor. Ofereci uma bebida, uísque é claro, afinal já estava aberto e era basicamente o que tinha no quarto. Não demorou sequer duas goladas para eu puxar ela para perto de mim e fazê-la sentir meu pau. Ela gostava muito. E toda vez que eu me aproximava eu pensava que bendito cachorro era o Leni. Demorou três meses desde o nosso encontro na lanchonete para que ela me ligasse. Quando ela me ligou eu andava comendo uma mulher do meu trabalho, precisamente minha chefe. Era um problema serio que eu havia arrumado. A mulher era incompetente no escritório porem era muito boa no sexo. Achei que ia ser difícil arrumar alguém assim e eu só continuava comendo ela por que estava difícil sair da relação sem perder meu emprego. Foda. Isso é de foder. Aí, me liga Rebeca. Rebeca Sant’Angelo. Rebeca “Santo Anjo” eu costumava dizer. Despertava em mim um sentimento devasso e protetor ao mesmo tempo. Às vezes ganhava um, às vezes o outro. Rebeca.

Agarrei os cabelos dela e dei um beijo forte. Ela mordeu meus lábios. Apertei seu rosto e a beijei novamente. Ela pegou minha mão e levou para dentro da sua saia. Ela estava sem calcinha. Desgraçada. Eu senti sua boceta molhada. Enfia seus dedos em mim. Quero dois. A loucura me possuía. Eu já não tinha mais controle. Eu não podia estar tão descontrolado assim. Fiz o que ela pediu.

Joguei-a na cama e botei meu pau para fora. ‘Vem cá. Bota ele na boca.’ O sorriso que ela me deu era como um desenho do Milo Manara saindo do papel. Era incrível como ela tinha o corpo de um dos desenhos do italiano. Era esguio e magro, mas com carne de sobra para pegar. E engatinhando pela cama pegou meu pau e colocou na sua boca. O vigor e a vontade que ela o consumia me deixavam cada vez mais excitado. Ela colocava tudo dentro da boca e tirava e colocava e tirava. Caralho, o que essa mulher estava fazendo comigo? Há algum tempo atrás eu era um funcionário de uma empresa de tecnologia, fraco, acomodado e feliz. Depois que encontrei Rebeca e passamos a sair me tornei um dos melhores vendedores de projetos da empresa. Acabara de fechar o terceiro negocio para implantar a tecnologia para os eventos esportivos que iriam acontecer na cidade. Eu estava rico e gastando meu dinheiro com tudo que eu queria e principalmente gastando meu tempo com Rebeca.

Me come vem.

‘Não fala assim’

Anda seu safado

Eu a agarrei com força e coloquei meu pau na sua boceta. A sensação continuava sendo incrível. Existia uma química sobrenatural entre nós. Eu não sabia dizer. Era carne. Só carne. Fodi ela muitas e muitas vezes. Ate ficar exausto. Cai sentado em uma cadeira e ela me olhava sorrindo. Parecia tão feliz quando eu.

Não esta se esquecendo de nada?

‘Como assim?’

Aqui ó. Não quer?

 

Ela me provocava. Eu aceitava. Ela queria, eu iria comer. Ela ficou de quatro e esperou. Disse que só fazia comigo. Que só eu sabia fazer. Não sei se era mentira. Mas eu me enganava com prazer.

De repente ouvi um barulho forte e quando me virei, um cara grande, alto e moreno entrava com rapidez para dentro do quarto. Em sua mão uma pistola e em seus olhos ódio. Foi tudo tão rápido que só senti a dor da porrada no meu rosto. Cai quase inconsciente.

“Sua piranha! Você esta me traindo sua puta!”

Carlos, para, por favor!

“Cala sua boca! Você estava dando o cu para esse filho da puta? Eu vou matar ele!”

Por favor, Carlos, me escuta.

Eu olhei para Carlos vindo em minha direção. Senti um frio na barriga. Como se minha vida estivesse realmente em risco, e estava. Rebeca o segurou. E Carlos esmurrou seu rosto com as costas da mão.

“Sua piranha desgraçada. Eu casei com você. E é isso que você faz? Eu vou te matar.”

Carlos

“Ajoelha”

Carlos

“Mandei ajoelhar”

Nesse momento com Rebeca de joelhos, nua, frágil, como uma criança que espera o castigo do pai que percebi que o instinto protetor era até mais forte que o sentimento devasso. Olhei ao lado e vi a garrafa de uísque que deixamos cair no chão e a arremessei na cabeça de Carlos que caiu quase desacordado. Peguei rapidamente sua arma e atirei em seu peito. Ali eu o matara. Havia me tornado um assassino. Puta-que-pariu. Eu havia matado um policial civil. Era muita sorte mesmo. Justamente agora que a vida estava começando a ficar boa. Cacete.

Olhei Rebeca atônita olhando o corpo inerte de Carlos e a levantei. ‘Toma, esse é meu cartão. A senha é a data que nos vimos à primeira vez. Rebeca acorda porra. Pega essa merda de cartão e some da porra do mapa’ Ok. E você? ‘Eu me viro, some e não volte. E se lembre de que, de alguma forma que eu não sei explicar, eu te amei.’ Eu também, vem comigo. ‘Eu não posso, preciso resolver uma questão antes e sei que não vai dar tempo de nos vermos de novo’

***

 

Agora era a hora de resolver o problema, fiz uma ligação para um amigo meu. Demorei vinte minutos no telefone e logo depois entrei em casa. Agora era a hora de falar tudo. A verdade dolorosa teria de ser dita. Entrei pela sala e vi Vanessa sentada no sofá lendo uma revista. Essa porra sempre me irritou depois que ganhei dinheiro. Mas eu amava aquela mulher mesmo tendo mudado tanto.

‘Vanessa, precisamos conversar.’

Paulo. O que houve? Que cara é essa? Você esta sangrando? Meu deus, você esta bem?

‘Estou bem sim. Me escuta. Eu matei um cara. E ele é policial. E preciso que você siga as minhas instruções’

Como assim? Por que você matou alguém?

‘Você vai seguir minhas instruções? Você faria isso? Para proteger nossa família?’

Paulo, o que aconteceu. Me fala!

‘Você vai seguir a porra das instruções?’

Vou. Vou. Fala

‘Eu tenho uma amante’

 
***

 

O enterro de Paulo tinham poucas pessoas. Seu pai, sua mãe, seus dois filhos, um ou dois amigos e sua esposa Vanessa. Todos chorosos. Todos tristes.

Vanessa olhou ao redor e viu uma mulher um pouco distante observando o enterro. Olhou para Figueiredo que colocou calmamente a mão sobre o ombro de Vanessa e se afastou um pouco.

Rebeca estava observando o enterro de Paulo quando foi abordada por um homem que a puxou para perto e ela pode sentir a pistola encostada em suas costas. Sabia que não deveria ter vindo e sentiu o mesmo medo daquele dia no hotel. O homem a carregou ate um carro estacionado e a colocou ali dentro.

Mal havia virado a primeira curva depois da saída do cemitério e um carro prata havia fechado o carro que Rebeca estava. O motorista tentou sair de ré, mas bateu em outro carro que acabava de impedir a passagem. Rebeca mal teve tempo de pensar e quatro homens saíram de cada carro com armas nas mãos e puxaram todos para fora. Tanto Rebeca quanto os caras que a haviam colocado para dentro. Do lado de fora, sem pestanejar um dos oito homens atirou no motorista e em outros dois, restando apenas o homem que a abordara.

‘Entra no carro Rebeca.’

Rebeca se perguntava como ele sabia seu nome, mas isso já não importava. Ela somente rezava baixo. E após alguns quilômetros o carro parou.

‘Sai do carro filho da puta.’ – E o homem que havia abordado Rebeca foi colocado para fora. Um dos outros homens a puxou para fora do carro.

‘E ai Figueiredo. Qual o plano?’

‘Vamos ver. Depende dele.’ – E virando-se para o homem continuou: ‘Quem te mandou?’

‘Não importa. Não vou falar.’

Figueiredo atirou no joelho do homem. O barulho quase ensurdeceu Rebeca. ‘O próximo é no saco. Quer ficar sem bolas e inútil?’

‘Foi o Josival. Amigo do Carlos. Foi ele.’

‘E onde ele mora?’

‘Mora na altura da passarela dez da Brasil. Meu deus.’

Outro tiro. Na cabeça. Sem piedade. Rebeca olhava atônita.

‘Rebeca. Meu nome é Figueiredo. Sou amigo de infância do Paulo e ele sabia que você não ia sumir. Te usamos de isca para proteger você e a família dele. Entra no carro com o Antunes e dessa vez some. O resto deixa comigo.’

Rebeca fez um sinal de afirmativo e andou até o carro onde estava parado o Antunes. Olhou pra Figueiredo e perguntou:

Aonde você vai?

‘Eu vou para a Brasil. E você vai sumir.’

Rebeca entrou no carro e pediu a Antunes:

Podemos passar na minha casa? Preciso pegar meu cachorro. Paulo o adorava.

E Figueiredo ficou vendo o carro virar no fim da estrada.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Selvagem

Deus, o Poeta primeiro
Poeta de almas, terras e mares,
De condores nos ares
Criou a alvorada, dia que começa
E o poente, vida que termina
Ipanema e suas garotas
Ajudou a criar as minissaias
Criador do futebol,
O Maraca, as torcidas e vaias,
Fla-Flus memoráveis
Me pergunto, que diria a Ele,
Vinicius, amante doloroso
Morto em seu próprio apaixonar-se
Drummond, mineiro vigoroso
Componente da paisagem,
E que paisagem, que paisagem...
O Diabo, praia infame
Era tão grande quando eu pequeno
Tantos amores, tantas dores, tantos poemas,
Que ficou pequena quando eu grande
E essa brisa violenta de tempo virado,
Convite para um mergulho,
Um banho de mar,
Um banho de amar,
Todas as garotas,
Todos os dias passados...
E que diriam os Astronautas,
Se tivessem visto primeiro,
Meu Rio de Janeiro,
Teriam Nazcas, Machus Picchus,
Gizés e belezas mais existido?
Fato é, teriam eles desistido!
Com esse sol, esse mar, essas minissaias
Pecariam, como peco eu.
Por vadiagem...

Deus, o poeta ultimo,
Que depois da minha ultima expiração
De todas ultimas expirações
Reescreverá tudo...
Vinicius, doeria eternamente...
Pilatos não lavaria as mãos...
Talvez mudasse tudo, ou quase tudo...
Não mudaria o Dois Irmãos,
Sim Pilatos suas mãos lavaria,
Que outra maneira o Redentor
Abraçaria a Guanabara?
Os astronautas não nos teriam deixado,
Tomariam água de coco...
E o Verão eterno da Cidade,
Não castigaria!
Apagaria um verso aqui,
Mudava uma palavra ali,
Uma letrinha acolá...
Teriam mais dias o Carnaval,
Mais folia menos labor,
Mais paixão e muito mais amor...
E com mais sol, mais mar e mais minissaias,
E anjinhas e diabinhas e noivinhas e abelhinhas
E colombinas...
Todos viveriam, como vivo eu...

Selvagem.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

On The Road

Júlio e Pietra eram um a versão do outro. Talvez por isso não se falassem mais. Os nossos defeitos em outras pessoas ficam muito piores, quase insuportáveis. Mas essa história não é sobre defeitos e virtudes, até poderia ser, mas talvez seja mais interessante deixar para outra. Essa história é sobre histórias interrompidas e sobre como os caminhos carregam as pessoas para situações limite. E uma história interrompida é um ciclo aberto, perigoso. A história de Júlio e Pietra terminou assim, interrompida. Ou melhor, não terminou. Ficou presa no vento das vidas, sempre com uma ponta de pensamento: E se amanhã?


***


O ar frio entrava pela narina de Júlio. Era inverno e a espera estava maltratando os ossos. Machucando o peito. Eram tantas coisas na cabeça, tantos medos e anseios. E o tempo esgotando impiedosamente. Estava perto do horário combinado e começou a se sentir como em uma historia de um livro do Harlan Coben em que o personagem principal após longos anos havia marcado um encontro com sua esposa que esteve desaparecida. A ansiedade, o medo, a negação, a aceitação e claro a impaciência.


“I call your name, but you are not there.
Was I to blame, for being unfair”


Um barulho surgiu atrás de Júlio e assustado ele se virou. Pássaros saiam em debandada de uma árvore por perto. ‘Que clichê’, pensou Júlio. Só faltava aparecer um desses vilões de filme de terror e mata-lo quando ele se virasse para frente. Os pensamentos começaram a vagar. E veio na cabeça a historia dele e de Pietra. Aquele Café no saguão do hotel. Como tudo aconteceu. Tao inesperado. O saguão...o Café.

- Oi.

- Oi. Pois não?

- Meu nome é Pietra. Estamos lendo o mesmo livro. Olhe!

- Ahn, sim – Júlio olhou para o livro On the Road do Jack Kerouac – Muito bom livro. Hã...você que se sentar?

- Não sei. Na verdade não sei por que vim falar com você. Desculpe, acho que me excedi.

- Não, não. Fica. Vamos pelo menos discutir o livro.

- Não, preciso ir. – E Pietra se virou para voltar para sua mesa porem Júlio pegou em sua mão com firmeza e suavidade.

- Não vá. Por favor.


***


Júlio e Pietra estavam no elevador do hotel. A tensão entre eles era nítida. Não conseguiam ficar tão longe e tão perto um do outro. Não resistiram. Os beijos eram acalorados e as mãos exploravam o corpo um do outro. Seios, lábios, coxas, peitos. As mãos entravam e saíam de dentro das roupas querendo tocar pele com pele. Maciez e arrepios. Queriam sentir o calor do toque e da paixão. Entraram no quarto e a tarde se perdeu na madrugada.

***

Júlio e Pietra se encontraram mais tarde no dia seguinte, no mesmo lugar. Nas mãos o mesmo livro. Discutiram Kerouac. Riram juntos. Contaram sobre suas vidas. Conectaram-se.  Porem, no dia seguinte não se viram. A saudade arrematou os corações, ou seriam as cabeças? Não importava. Já sentiam a falta um do outro. Encontraram-se alguns dias depois.


“quando a gente conversa
Contando casos besteiras
Tanta coisa em comum
Deixando escapar segredos”


- Senti falta de você. – disse Júlio.

- Eu também – disse Pietra

Dias, meses se passaram. Nesse tempo Pietra começou a namorar. Terminou. Júlio engatou um romance que teve fim. Affairs iam e vinham. Nada duradouro, nada definitivo. As confissões aumentaram. Começaram a conhecer um ao outro como o livro que liam juntos. As reações, o que cada um queria dizer sem precisar realmente falar. O sentido do que queriam dizer. Começaram as brigas. Discussões sobre posições, sobre o que pensava cada um. As posturas que mudaram sem perceber. E um dia sentados em um café tiveram um encontro como um qualquer.


- Como você esta? Parece preocupada.

- Estou bem. Esse final de semana levei uns amigos para beber lá em casa.

- Que bom. E se divertiram?

- Claro. Amigos meus tem que se divertir. – disse Pietra rindo

- Entendi.

- É.

Alguma distancia estava abismando os dois. Como se quisessem discutir o indiscutível. Porem com medo de falar sobre isso e ver tudo desmoronar.

- Me diz como você esta. Você realmente parece preocupada.

- Não estou. A gente se vê depois?

- Pietra.  Você esta me enganando. E sabe disso. Esta fazendo de proposito.

- Nós não somos nada um do outro. Não me cobre. Você sabe que eu não suporto isso.

- Sei. Mas você também me cobrou e também não gosto disso.

- Não interessa.

- Você não quer mais me ver. É isso.

- Por que diabos eu iria querer isso?

- Pietra, não entendo. Nos damos tão bem juntos. Não entendo por que não podemos continuar nos dando bem. Não vou mais cobrar você.


***


Júlio não aguentava mais essa espera. Pietra estava atrasada. Falaram-se tão rápido da ultima vez. E depois permaneceram quase dois meses sem se falar. Júlio já não sabia se ambos se afastaram ou apenas um, e tinha até medo de saber. Será que foi ela? Será que ele também deixou passar tempo demais?  Por que não se procuravam para conversar? O fim mesmo? Assim, interrompido? Sem mais, sem menos?

Porem, depois de um tempo, Júlio recebeu um telegrama de Pietra marcando um encontro. Ela havia feito um convite para se encontrarem e conversar, quem sabe corrigir erros. Ou pelo menos acabar com o clima de briga que havia ficado. A aspereza das palavras. Tudo que estava estranho entre eles. Poderiam ate não se falar mais ou não se ver mais depois. Mas teriam a certeza de que não foi interrompido, não havia mais aquele câncer consumindo a relação que insistia em existir justamente por isso. De certa forma foram importantes um ao outro. E isso já teria feito valer a pena.


“Tente
E não diga que a vitória esta perdida
Se é de batalhas que se vive a vida
Tente outra vez”


Sete horas. Oito horas. Nove horas. Júlio percebeu que Pietra não viria. Ele pensava por que nem uma noticia. E se perguntava por que a historia havia passado. Mais uma história interrompida. E Júlio saiu com frio e neve dentro de si. Pegou um ônibus e voltou para casa. Ao entrar sentou-se no sofá e pensou como seria se tivessem se encontrado. Deu um sorriso brando e falso para si e decidiu dormir.


***


Pietra estava sentada em sua cama, olhando para o livro On the Road, onde na ultima pagina estava escrito: “Esse era o meu. Já que você perdeu o seu, te dou de presente. Nunca jogue ele fora senão estará jogando a mim.”.

Olhou para o exame de gravidez. Positivo. Não podia ser, não era para ser. Ela não queria essa marca já que não iria vê-lo mais. Não queria, não podia. De jeito nenhum. Mas o exame estava ali dizendo justamente o contrário.


“você sonhava acordada
Um jeito de não sentir dor
Prendia o choro e aguava o bom do amor
Prendia o choro e aguava o bom do amor”





Pietra olhou mais alguns instantes para o livro. Pensou em joga-lo fora, mas guardou em uma gaveta que talvez fosse aberta novamente no futuro. 

domingo, 24 de novembro de 2013

A Paz

O ‘amei mais do que pude’
Presente sempre se faz
A cada lembrança, cada recordação
Do tempo que nós éramos em paz
De cada vez que palpitava o coração
Há tempos e tempos atrás...

Como seria bom revivê-lo
O tempo dos sorrisos espontâneos
Em que meu peito era seu lar
Em que sozinhos, nus em pelo
Nos afogávamos em nosso amar

Por que está tudo tão distante?
Sentes como eu?
Por que aquele tempo não passa
De retratos em nossas estantes?

Nosso passado – feliz – virou nostalgia,
E que nostalgia... Pudera,
Deixamos Ivan Lins com inveja
Todas as estações eram Primavera
Todos os amantes e poetas e românticos e desesperados
Com inveja...

Por completarmos a si mesmos,
Como Léo e Bia... com mestria,
Como Paula e Bebeto, nos amamos à vera
Nossa forma de amor valeu a pena... vale!
Mas acabou... Como um sonho bom...

E nos arrasou...
Faz tanto tempo, não faz?
Hoje, não sei você, mas eu vivo mendigando,
Seu olhar - familiar, seu beijo – doce, seu corpo – meu, nossa paz...
Sem parar, em quantos corpos precisar...
Em quantos corpos até encontrar...
Onde nosso amor jaz?
Lá quero sentir-te, uma vez mais...
Mais uma vez, minha musa, nos amar

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

CONTINUAÇÃO - Thiago Zefiro



CONTINUAÇÃO



Não passa essa vontade.

Sem graça, é viver

Quando se sabe a verdade,

de voltar ou de ser



Parece que a vida roda,

mas no fundo, continua.

É foda, ficar ou se manter.

Não ter a tua morena, nua.



Mais simples quando somos.

Mas nos pedem que tenhamos.

E quando quase acostumamos ...

Temos que voltar,

e ser o que não queremos,

para ter o que os outros querem

e não para ser o que queremos.



Água p’ra lavar a alma

P’ra levar as mágoas

P’ra trazer a calma

“E um pouco mais de paciência”



Acho que não dá p’ra viver assim

Uma vida inteira, cheia de paixão

Essa coisa toda, que parece sem fim

E sobretudo ouvir, que continua são.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Sana (ou Balanço de Rede ou Um dia no Paraíso)

Pombo pássaro guia
Peito de guerreiro
E contatos imediatos
Alto do alto do alto vigia

Pai e mãe, alma lavada
É noite dormida ao relento
Nunca mais noite guardada
Em quarto de apartamento

Peito de Pombo, Realeza
Calmaria
Peito do Pombo, beleza
Magia

Verão de amor
Rede Esticada
Disco Voador
Morena dourada
Sorriso e calor
Colo de namorada...

Lua! Lua... olho do céu
Relógio quebrado
Mente encontros léu
Arrasta-pé colado

Fogueira noite estrelada
Amizade amor coletivo
Borboletas esperanças...
Brincadeiras de crianças
Áfricas e Américas e madrugada!
Cocar Judah primitivo
Sete quedas andanças
Das cidades fugitivos
Cores e sons e revoadas...

E um coração inquieto com vontade de voltar...

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A dança das Borboletas II

Longe, quando nela penso,
Sinto, algo anda me faltando
E à noite, criança, chorando
A esquecer-me fico propenso

As estrelas no teto de meu lar
De nada valem sem seu amor
De nada valem sem seu calor
Não podem sequer me guiar

E a cada segundo que chego perto
Do reencontro, sempre tão sonhado
O coração bate, tão descompassado
E me treme todo o corpo, decerto

Famosas borboletas na barriga, a dançar
Me dominam como a um fraco menino
Diante de um presente, sem tino

Sem ver o resto do mundo a rodar...

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Feliz Aniversário

Envelhecer, o que não é senão,
Amadurecer seu caso com a morte?
Augúrios fisiológicos de um encontro
Que não se foge, nem com sorte...

Me dizem todos, feliz aniversário,
Ah se eles soubessem de minha crise
Me deixavam ser Peter, sem mais,
Eterno menino, longe de tanto grise

Se em minha pele vivessem, por um segundo
Me dariam bom dia, de resto, ficariam calados
Assim, mesmo que escondido, eu sorriria
Jamais chegaria ao tempo de tempos acabados...

Envelhecer, o que não é senão
O Anjo da Foice, abraçar enternecido
Quando mais perto da gadanha
Mais me sinto como se tivesse perdido...

E não o fiz?

Dia a dia, preso à rotina do mundo
Casa, família, filhos e trabalho...
Me dizem depois, quanto sucesso!
Não me sinto mais do que um espantalho.

E os garotos perdidos, estão perdidos,
Comigo nenhum deles pode contar,
A cada dia que passa, viro o Capitão
Medo constante de um tiquetaquear.

E em altos brados elevo meu grito
Sem que me ouçam - ou finjam não ouvir
Direi, algum deus há de me escutar,
Saúde, paz, amor e felicidade, me tirem tudo,

Mas não me deixem dessa vida partir...

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Eternidade

Quero viver a vida com toda a pompa reservada a mim
Quero vivê-la, em cores vivas , como um aquarela
Não quero viver essa vida como se não tivesse fim
Não quero a vida triste de ir ao mercado casado
E das mãos da minha mulher provar a mortadela
Não quero mediocridade...

Quero viver a vida com dor, com suor, sem cuidado
Quero vive-la como se hoje fosse meu ultimo dia
Não quero viver essa vida como se fosse um soldado
A disciplina, minha liberdade não vai cercear
Não quero comer calado, nem me comportar
Quero ter minha vaidade...

Quero viver a vida ardente da noite, da boemia
Chega de ser o bom homem padrão
Quero viver a vida na amplitude das possibilidades
Não quero casa, não quero família... quero asas!
Quero luxúria, pecado, bater meu coração
Não quero responsabilidade...

Quero viver a vida com amores infinitos,
Que eles não acabem quando as mãos
Se separarem quando vem poste no caminho
Quero estar aqui, ela lá, nós aqui, que ela se vá...
Não quero radio, tv, livro também não...
Quero atividade...

Quero viver a vida no meu livre arbítrio
Quero viver a vida do meu jeito, com respeito
A todos... não quero a promessa divina,
Não quero penitência, tampouco salvação
Quero o que construí, com minha própria mão,
Não quero, nem de longe, a eternidade...

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Casal

O céu era azul
Anil como nas canções
O sol apimentava
Vítimas de explosões
Juntos se debatiam
Não ouviam sermões
Primeiras, segundas,
Todas as intenções
E saíam para rodar
Sambistas e chorões
E as noites ardentes
Pandeiros e violões
Mas se perderam
Inconciliáveis direções

Qualquer Lugar

Mesa cheia e colorida
Amarelo ouro – nos copos
Alvi-negros a chorar
Rubros-negros a xingar
Tricolores à pagar
Cruz-maltinos a gritar
Mesa cheia e barulhenta
Copos cheios – copos americanos
Gravatas-borboletas
Foxtrotes para se equilibrar
O pegador a se gabar
O tímido a se avermelhar
O casado a se justificar
Mesa cheia e florida
A loira a se maquiar
Morena a fascinar
A gostosa a se entregar
A mulata a sambar, encantar,
Fazendo os desavisados penar...
Com mãos nas ‘cadeiras’
Rosas a se espalhar
Mesas cheias a se misturar
Gravata-borboleta a faturar
Copos a tilintar
E a entornar – sempre tem alguém
Para entorna-los
Todos a beijar
Até o tímido... a se realizar
Samba até o sol raiar
Corações a voar
O dono a bradar
Contas a pagar
Uns a pendurar - todos na verdade,
Portas a baixar
Taxis a ignorar
Ir pra casa à andar
Ou com o jaleco da escola...

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Tácito (Paulo Cerezo)

Tácito (Paulo Cerezo)

Dentro do peito, me calo.
Dentro do calo, me espanto!
De um pranto
Contenho meu grito,
E, no infinito,
Refaço-me santo
(embora sem manto, sem rito,
ou escrito em adianto).
Trago essa inquieteza de alma leve,
Que sempre me acompanha.
Esse menino, que apanha,
Mas põe a mão onde não deve.

Até minha poesia me cerceia...
A que ponto!
Sintática,
Estática,
Gramática - não me leia!
Larga-me, e pronto!

Vale, de fato, a lua cheia,
A mesma candeia
Que é idéia de poeta
Desde antes de sempre;
Uma bebida que embriaga,
Uma casa longe de casa,
Um amor mal resolvido,
Uma saudade bem vivida,
Um arrependimento,
E tudo quanto é fraqueza.

Há sempre tristeza na mão do poeta.
Há sempre saudade no seu olhar.
Há sempre uma palavra que falta
(E que pai-dos-burros a teria?!).

Extensão do espírito, o verso;
O amor que o mundo não sente:
Eis aí o que estamos a dizer-lhes.






quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Menino

Eu durmo de ponta cabeça
Na cabeceira, meus pés,
E neles os sonhos... 

No pé da cama, o travesseiro
E o cuidado para nao cair,
O braço pendurado pra me segurar

E minha vida passa e isso nao muda
Vivo aos avessos, contra a mare
Fazendo meu caminho, uma contra-mao...

Em campo quero ir pro gol
O coraçao deixo nos bordeis
Beijo, e sonho, de olhos abertos

Meu dinheiro é diversao de terceiros
Só nao fujo do que é natural
No sol queimo, na chuva molho
Mas no resto, sou eu que mando


E hoje, tenho casa... mas sou só um menino...

domingo, 20 de outubro de 2013

Amores - Parte II - Volta para casa


A chave fez um barulho ensurdecedor na fechadura. Era a pior coisa que poderia acontecer à Talita naquele momento. Ela tentou conter o barulho que era pior que o de uma torcida ensandecida com o gol salvador no fim do jogo. Como um enxame de abelhas raivosas querendo vingar a morte de sua rainha. Mas esse barulho só acontecia aos ouvidos de Talita. A realidade era diferente. Esse barulho com certeza não acordaria sua mãe Irene. Ela continuaria dormindo calmamente se não fosse por um simples detalhe: Dona Irene estava acordada esperando Talita.

O leitor agora poderia pensar: Tenho uma mãe assim! Claro, todos temos. Mas Dona Irene era pior. Por que pior? Por que Talita era, como diziam seus avós, complicada.

Talita mal fechou a porta e Dona Irene não tardou a fazer um barulho com seus chinelos no chão para atrair a atenção da filha. Aprumou-se em sua cadeira, pigarreou forçadamente e não resistiu:

- Espero que você não esteja bêbada.

- Oi mãe. Não estou não. – E tentou ir para o quarto que ficava a poucos passos que seriam difíceis de completar nesse momento.

- Mas você bebeu! Eu sinto daqui.

- Sim mãe. Só um pouquinho. – E Talita manteve foco em, sorrateiramente, ir para seu quarto.

- Volta aqui Talita! Eu quero conversar.

Talita voltou. Indócil. Incomodada. Não era possível que sua mãe seria tão ridícula a esse ponto.

Agora o leitor sendo um filho pensaria em quantas vezes teve que passar por essa situação estapafúrdia. Sendo um pai pensaria em por que os filhos fazem isso e o obriga a tomar atitudes como essa. Bom, são as regras. Jovens as quebram, adultos as fazem. Pais as fazem cumprir. Ou tentam o melhor de si.

- Fala mãe! O que você quer?

Dona Irene se aproximou de Talita e fungou profundamente. Seus olhos se perderam no espaço, no chão. Tornou a erguê-los e olhando para Talita disse:

- Você dormiu com alguém?

- Sim. E não seja antiquada. Eu não dormi. Eu transei mãe. Por quê? Não posso?

- Filha, (e um breve momento de ternura dominou Dona Irene) você não pode dormir com rapazes que você mal conhece. Não pega bem.

- E por que não pega bem? Eu faço o que quero mãe. Eles não fazem o que querem?

Aproveito agora então, para descrever Talita. Talita era linda. Mas o importante realmente não era isso. A parte física de Talita é o de menos, mesmo que ela fosse considerada uma pintura de Caravaggio ou uma escultura de Rodin. O que importava mesmo era o que era Talita. E ela era mágica. Eclética. Espontânea. Alegre. E tinha um Rodin, um Caravaggio, um Strauss (e às vezes um Metallica), um Fellini (e em grande parte um Woody Allen) e por que não um pouco até de Lavoisier dentro de si. Talita era uma Madame Bovary do século XXI! Mas era incompreendida. Atrozmente podada. Ferozmente limitada.

- Mas filha. Você não pode. – e Dona Irene passou a se incomodar com a postura da filha – Eles podem. Você não. O mundo é assim.

- Não mãe. Não é. Foi o seu mundo. Meu mundo é diferente. Assim como o seu foi diferente do da sua mãe!

- Minha filha, assim você fica parecendo uma piranha. Daqui a pouco você vai ser mal falada pela vizinhança.

- Mãe, não importa. Eu quero os mesmos direitos e mesmos deveres de qualquer pessoa. Quero ser igual. Quero poder fazer o que quero na hora que quero.

- Não! Não é assim. Minha filha não vai ficar solta por ai. Como uma qualquer, fácil, que não se importa com o que as pessoas vão dizer. Assim você não vai se casar.

- Não seja hipócrita. Você era divorciada e ainda assim meu pai ficou com você. Pelo que você era. Não pelo que a sociedade dizia o que você era.

Outra pausa se faz aqui para o leitor entender. Talita havia perdido o pai há três anos. Ela tinha apenas quinze anos e sua irmã cinco. E ao contrario do que alguns poderiam imaginar, o comportamento e personalidade de Talita não foram afetados significativamente pela perda. Ela sentiu a falta do eterno ombro amigo, como a maioria também iria sentir, mas não alterou radicalmente nada do que Talita foi e é.

- Nunca repita isso! – Dona Irene levantou a mão em riste ameaçando passar dos limites verbais. – Você não tem esse direito!

- Direito de que? De dizer o que penso de você? Direito de me defender das suas acusações? Sim eu tenho. Sou uma pessoa. Eu transo com quem quero e quando quero. Seja meu namorado ou alguém que conheci hoje. Não importa. Isso não me diminui e não da direito a ninguém de me diminuir. Nem você nem ninguém.

Dona Irene viu que esse caminho não era a solução. Apelou para o emocional. Arriscando um ultimo argumento falou:

- E amor minha filha? Desse jeito você nunca vai conhecer o amor. Amores rápidos não são amores. Perdem-se no tempo facilmente. E ninguém gosta de saber que não é especial. Que você não tem nada a oferecer que seja único. Já pensou nisso?

- Mãe, eu não estou oferecendo nada a ninguém. Não quero nada em troca. Não estou me vendendo. E amo toda vez! Se amo muito, repito. Se amo pouco, esqueço. Amor é uma sequencia de pequenos amores que se completam e se unem em um amor só. E um dia vou encontrar um amor desses como todo mundo encontra. Por que sou uma pessoa com defeitos e virtudes que vai se encaixar com outros defeitos e virtudes.

Talita deu uma pausa e falou para sua mãe enquanto beijava levemente sua testa:

- Mãe, eu sou feliz. Isso que é importante. Eu sei que você se preocupa. Mas deixa eu ser feliz. Eu te amo.

Dona Irene fez menção de responder, mas Talita já havia entrado em seu quarto. E ali, sozinha no corredor que unia a sala dos quartos ela balbuciou quase para si:

- Eu também te amo minha filha.

E caminhando ate o quarto abriu a porta de Camila, sua filha mais nova e a viu dormindo tranquilamente. Foi para o quarto e se deitou. E quase pegando no sono Dona Irene sentiu a aproximação de Talita.

- Mãe. Eu entendo seu amor de mãe. Você quer o melhor pra mim. Entendo seu amor, entendo sua proteção. E você está certa. Obrigado por isso. E vou te contar a verdade. Hoje não dormi com ninguém. Fui me encontrar com Marcos. Vamos ficar juntos.

- E ele é um bom rapaz?

- Acho que me ama. E eu amo ele. E mãe, preciso mais do que nunca de você. – a voz de Talita começava a embargar e lagrimas corriam de seus olhos. – Você vai ser avó.

Dona Irene abriu um sorriso imenso e seus olhos se entregaram à felicidade. Seu peito ardia de soluços. E as duas se abraçaram firmemente. O Amor, em todas as suas formas e em todas suas intensidades estava agora transbordando nesse simples abraço.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A mentira

A mentira, que chamam Paixão
É mais o que o Poeta inventa
É mais dele uma criação
É disso que su'alma se alimenta

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Amores - Parte I - Fatima


Fátima.

O que eu pensava quando ouvia esse nome? Com certeza era na minha antiga colega de escola. Tanto tempo se passou e eu nunca mais soube dela. Disseram que havia voltado pro Maranhão. Que havia virado modelo em Paris. Que simplesmente mudou de bairro e havia se casado com um policial.

Pensar era o mais simples. Sonhei tantas vezes com ela. Com nosso único beijo perto da agencia bancaria que ficava do lado do colégio. A agencia ficava recuada, o que para nós, garotos, era suficientemente escondido. Ilusão. Não poderia ser mais explicito, mas sinceramente não importava. A pele escura de sol, os cabelos cor de mel queimado, o sorriso branco e largo. Era incrível. Nunca achei que a veria novamente. E eu, com certeza, estava enganado.

A cerimônia havia terminado e a festa começava. Meu irmão estava tão feliz e encantado com sua noiva. Alias, Paloma era linda, perfeita. Era feita para meu irmão e meu irmão feito para ela. Era impossível traduzir a felicidade nos olhos deles e de todos os convidados. Fui olhando cada um deles. Cada rosto trazendo consigo um nível de amizade e intimidade. Todos, sem exceção, demonstravam sua torcida e seus agradecimentos aos noivos. Incrível como eu conseguia estar mais feliz que todos. Até que meus olhos cruzaram os dela. O mundo parou. Ficou opaco. O som sumiu. Pensei em Tom Jobim: “e eu me esqueço ate do futebol”. Notei que ela estava com um amigo de trabalho do meu irmão. Eu não o conhecia. Mas a mulher que o acompanhava simplesmente me tirava do lugar. Sem razão tirava, girava e recolocava meu eixo.

Eu já não sabia o que fazer, mas precisava falar com ela. Dizer que ainda a amava. Que o amor que eu senti no primeiro beijo ainda ardia dentro de mim. Como se a vida não tivesse sido justa. Será que ela sentia o mesmo? Será que nosso amor enfim seria real? Meu deus, como pode isso? E como fica minha vida? Eu acabei de me reconciliar com Amanda. E a Julinha e o Paulinho? Será que eles aguentariam outra briga? Outro rompimento? Será que eu não estaria sendo infantil? Buscar amor verdadeiro seria infantil? E eu amo Amanda, mas...sempre esses mas...será que o mas não deveria ser  ‘amo Amanda mas fim’?

Aproveitei o momento que o companheiro de Fátima havia ido ao banheiro e andei na sua direção. Tomei coragem. Era a hora.

***

 

Eu estava aflita. Assim que entramos na igreja eu o vi ao lado do Noivo. Padrinho dele. Irmão dele. Inacreditável. E eu não se lembrava do nome do irmão e por isso aceitei desprevenidamente o convite. E agora eu estava com o corpo todo tremendo. Em chamas. Nosso primeiro beijo. Mágico. Intenso. Sexy. Eu não consegui encontrar outro beijo igual. Eu amava meu marido. Ele era um ótimo companheiro. Conseguia me fazer feliz. Diferentemente dos meus outros namorados. Que me queriam pelo corpo e não por mim. Só corpo. E por isso nunca houve entrega.

Eu me lembro da tristeza que senti quando tive que voltar pro Maranhão, e deixa-lo. Não existia um único pedaço de mim que não havia se fechado para amor. E quando fui ser modelo em Paris, um mundo novo apareceu. Novas experiências e novas pessoas. Pensei que poderia estar livre para amar e amei um pouco, claro, mas sofri bem mais. E essa vida me cansou. Voltei e pensei em procura-lo. Tentar reviver a paixão. O encontro místico que aconteceu naquela agencia bancaria ao lado do colégio. Mas não tive coragem. Por quê? O que meu deixou tão insegura? O que me fez recuar? Eu não tinha nada e nem ninguém. Nem os conselhos de minha mãe eu tinha mais. Era buscar os braços dele.

Meu marido me olhou sorrindo. Dizia que estava muito feliz de ver seu amigo casando. E que estava repensando festa na igreja. Que momento para ele me dizer isso. Fiquei feliz claro. Mas nada era igual nesta noite. Nesse momento, do outro lado do salão, vi nossos olhos se cruzarem. O tremor aumentou. Eu já não conseguia me concentrar. O que eu deveria fazer agora? Ele tinha uma companheira e duas crianças se jogavam com tanta felicidade em seu colo. Seria justo uma família feliz se desfazer por um passado? E será que ele aceitaria criar uma terceira criança? Não acreditava que eu havia pensado nisso. Eu, grávida, pensando em cair nos braços de outro homem. Assim sem remorso. Será que o amor muda tanto assim nossa visão de realidade?

Jonas havia ido ao banheiro e eu estava sozinha. Com frio. Perdida. E eu o vi caminhar na minha direção. Decidi ir ao seu encontro. Tomei coragem. Era a hora.

***

 

Carlos e Fátima caminhavam um em direção ao outro. O salão apesar de espaçoso não era grande, porem para ambos pareciam quilômetros a serem percorridos. O tempo parecia passar mais rápido que o normal e ambos pensavam se o mundo havia parado para vê-los. Se alguém iria desconfiar daquele encontro prestes a acontecer. Perguntavam-se qual seria a primeira reação. O que iriam dizer um ao outro. E finalmente se encontraram tão perto que poderiam se tocar e Carlos disse:

- Boa noite.

- Boa noite. – respondeu Fátima.

Carlos continuou sua caminhada agora em direção aos seus amigos que estavam contando piadas em uma roda próxima. Fátima por sua vez continuou sua caminhada em direção à porta do banheiro masculino. E depois de tanto tempo de espera ambos pensaram ao mesmo tempo:

‘É tão ruim que a vida não é só o que queremos. Nada é tão simples.’